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SBPA | BOLETIM RAÍZES N.1 MAIO 2022

SBPA | BOLETIM RAÍZES N.1 MAIO 2022

UM COMENTÁRIO PSICOLÓGICO SOBRE NOTÍCIAS RIZOMÁTICAS

 

Bem-vindos ao Boletim Raízes. Este será o nosso espaço mensal para repercutirmos por meio do pensamento psicológico as notícias que consideramos mobilizar aspectos culturais brasileiros fundamentais para a individuação de nossos povos.

 

No início de Maio de 2022, tivemos notícia do estupro e morte de uma menina yanomami em terras indígenas disputadas por garimpeiros ilegais. Em seguida, cerca de 24 pessoas da aldeia Aracaça, na região dos Waikás, em Roraima, desapareceram. Havia indícios de incêndio.

 

Fantasias de aniquilação, genocídio e morte prontamente atravessaram as principais redes sociais. Esta não é a primeira vez. Como nos conta Roberto Gambini, o Brasil nasce de um estupro: os colonizadores violentaram e mataram nossos indígenas repetidamente por meio dos séculos. Invadiram e tomaram. A cada nova morte de cada pessoa indígena, reproduzimos nossa ancestralidade que nasce da violência e na violência se estabelece e se expande.

 

Jung nos conta sobre as fantasias do Wotan alemão e sua fúria descompensada que sustentaram a imaginação de guerra e dominação na Europa na primeira metade do século XX. Tais questões foram revividas recentemente quando um psicanalista acusou Jung de uma ligação perigosa com o nazismo no período anterior à segunda guerra. Frente ao genocídio indígena, podemos nos perguntar: qual é o nosso Wotan? Que fantasia é essa que sustenta o frenesi desenvolvimentista do governo e de parcela significativa da população que o apóia explicitamente ou por omissão, permitindo que continuemos a dizimar nossos povos originários?

 

Os Brasis que ocupam nosso território são atravessados pelo genocídio do povo indígena, pelo trauma da escravidão e a violência de nossa ditadura militar mais recente. Agimos como se tudo isso não fosse parte de nós; negamos nossos vínculos especialmente com os povos indígenas, com nossa natureza mais intocada e nossos saberes tradicionais. Recorremos às mitologias distantes e não conhecemos as crenças e lendas dos nossos povos. Os arquétipos caminham entre nós, mas nós os ignoramos e exterminamos aqueles que mantêm com eles um contato próximo. Quem poderemos ser quando não quisermos mais ser europeus? Quem seremos nós quando entendermos que somos uma terra de pessoas pretas e pardas sob o chão dos povos originários? Como nos ensina Guimarães Rosa, o que a vida pede de nós é coragem.